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A evolução dos patrocínios no futebol brasileiro ao longo dos anos tem sido um reflexo direto das transformações econômicas pelas quais o país passou. Marcas de diversos setores têm reconhecido o potencial de visibilidade que o esporte proporciona, levando-as a investir consideravelmente para estampar seus logotipos nas camisas dos clubes. Desde o período de instabilidade econômica até momentos de crescimento e ascensão de setores específicos, essa relação entre marcas e clubes de futebol tem sido uma parceria estratégica.

Neste artigo, iremos explorar essa evolução dos patrocínios no contexto do futebol brasileiro, destacando os principais marcos e as mudanças que moldaram essa indústria ao longo do tempo.

A Coca-Cola e o início da era dos patrocínios no Brasil

No período final da ditadura militar, o Brasil enfrentou uma conjuntura econômica turbulenta, marcada por altos índices de inflação e conhecida como o “pesadelo econômico”. Nesse contexto desafiador, tanto empresas nacionais como estrangeiras encontravam dificuldades para investir no país. A instabilidade econômica criava um cenário pouco propício para parcerias de patrocínio no futebol brasileiro.

Em 1987, após a transição democrática, a crise financeira também atingiu a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), o que levou à liberação dos patrocínios nos clubes. Surgiu, então, o Clube dos 13, uma associação composta pelos 13 principais clubes do Brasil, que buscava criar a Copa União com o intuito de fortalecer o futebol nacional. Essa iniciativa abriu novas oportunidades para empresas investirem no esporte e estamparem suas marcas nas camisas dos clubes.

Nesse cenário de mudanças, a Coca-Cola, gigante do setor de refrigerantes, decidiu ousar e investir pesadamente no futebol brasileiro, patrocinando o campeonato como um todo e estampando seu logotipo em 10 clubes. Esse monopólio de patrocínio, embora mostre a confiança da empresa no potencial do futebol como ferramenta de marketing, também revela a fragilidade econômica do país na época, pois poucas empresas estavam dispostas a investir. Somente Corinthians e Flamengo optaram por buscar seus próprios patrocínios, estabelecendo acordos com a Kalunga e Lubrax, respectivamente, mostrando uma certa autonomia em meio à situação econômica delicada.

O período marcado pela liberação dos patrocínios e pela atuação do Clube dos 13 e da Coca-Cola representa um ponto de inflexão na história dos patrocínios no futebol brasileiro. À medida que a economia se estabilizava e o país se abria para o mercado internacional, novas oportunidades de investimento surgiram. Isso possibilitou o crescimento e a diversificação dos patrocínios no futebol, com marcas de diversos setores aproveitando a popularidade e visibilidade do esporte para promover seus produtos e fortalecer suas identidades. Desde então, a evolução dos patrocínios no futebol brasileiro continua a ser influenciada pelo contexto econômico do país, refletindo as mudanças no cenário político e social.

Coca-Cola chegou a estampanhar na camisa da própria seleção brasileira

Coca-Cola chegou a estampanhar na camisa da própria seleção brasileira

O Plano Real e a diversidade de patrocínios

Durante o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, o Brasil vivenciou um período marcado pelo lançamento do Plano Real, uma medida econômica que conseguiu estabilizar a economia do país após anos de inflação descontrolada. Essa estabilidade econômica abriu espaço para investimentos em diversos setores, e o futebol não ficou de fora desse cenário.

Um exemplo notável foi a parceria entre a empresa Parmalat, do setor de laticínios, e o clube de futebol Palmeiras. A Parmalat decidiu investir para estampar sua marca na camisa do time alviverde, e essa associação se mostrou um grande sucesso, coincidindo com uma das épocas mais vitoriosas para o clube. Além disso, a empresa, que possuía uma fábrica no Brasil, percebeu um crescimento significativo, com cerca de 30% de aumento no consumo de leite em apenas seis anos.

Palmeiras da era Parmalat contava com craques como Roberto Carlos, Edmundo, Evair, Zinho, Edilson e César Sampaio.

Palmeiras da era Parmalat contava com craques como Roberto Carlos, Edmundo, Evair, Zinho, Edilson e César Sampaio.

O êxito da parceria entre a Parmalat e o Palmeiras incentivou outras empresas do setor alimentício a seguirem o mesmo caminho, buscando se tornar marcas icônicas na memória dos torcedores por meio do patrocínio em camisas de clubes de futebol. Um exemplo foi a Batavo, que estampou sua marca na camisa do Corinthians e ficou eternizada com o título do mundial de 2000, um marco histórico para o clube paulista.

Essas parcerias exemplificam como o futebol brasileiro se tornou um terreno fértil para empresas promoverem suas marcas e produtos, aproveitando a enorme visibilidade do esporte. O sucesso dessas iniciativas não apenas fortaleceu as relações entre marcas e clubes, mas também contribuiu para a consolidação do futebol como uma importante ferramenta de marketing e promoção no Brasil. A evolução dos patrocínios no futebol continuou a se moldar ao longo dos anos, refletindo as transformações no contexto econômico e social do país.

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Governo Lula e a ascensão da classe média

No início dos anos 2000, após a eleição do presidente Lula, o Brasil testemunhou a implementação de uma política social voltada para ascender a classe média e reduzir a desigualdade econômica, proporcionando maior poder de compra às camadas mais pobres da população, inclusive para produtos eletrônicos. Esse cenário abriu portas para empresas do setor eletrônico, como LG, Semp Toshiba, Panasonic, Motorola e Samsung, que passaram a investir fortemente em patrocínios de clubes de futebol brasileiros.

Esses patrocínios tiveram um impacto significativo, conferindo grande visibilidade às marcas envolvidas. A LG, por exemplo, ficou marcada por estampar sua marca na camisa do São Paulo durante uma era de ouro do time, quando conquistaram títulos importantes como o Campeonato Paulista, a Libertadores e o Mundial, em 2005, além de alcançar o tricampeonato brasileiro em 2006, 2007 e 2008. Outro caso de sucesso foi a Samsung, que estampou sua marca na camisa do Corinthians em 2005, ano em que o time conquistou o título brasileiro e teve um dos maiores ídolos da torcida, Carlos Tévez, vestindo a camisa alvinegra.

Esses patrocínios impulsionaram significativamente as vendas de produtos eletrônicos no Brasil. O aumento foi notável, com as vendas saltando de 2 milhões de unidades até o final do século XX para 14 milhões até o ano de 2010. Esse crescimento exponencial é um reflexo direto da conexão entre o sucesso dos times de futebol, as marcas patrocinadoras e o desejo dos torcedores de se associarem aos ídolos e conquistas esportivas.

O investimento das empresas do setor eletrônico no futebol brasileiro durante essa época se mostrou uma estratégia bem-sucedida, unindo paixão nacional e marketing. A presença das marcas nas camisas dos clubes proporcionou uma exposição massiva, aumentando a identificação dos consumidores com os produtos e contribuindo para o crescimento da indústria de eletrônicos no país. Essa fase da evolução dos patrocínios no futebol brasileiro evidencia como o esporte pode ser uma poderosa plataforma para as marcas alcançarem seu público-alvo e impulsionarem suas vendas.

A crise norte-americana e oportunidade dos bancos

Em 2008, a quebra do banco Lehman Brothers teve um impacto direto no cenário publicitário do futebol brasileiro. A crise financeira global abalou o mercado e muitos clubes enfrentaram dificuldades para encontrar patrocínios privados, enquanto outros viram seus patrocínios estatais serem retirados. Esse período de instabilidade econômica gerou incertezas nos investidores, tornando o ambiente menos propício para parcerias de patrocínio.

Por volta de 2010, contudo, os bancos enxergaram uma oportunidade estratégica e decidiram investir na paixão nacional, o futebol. Um exemplo notável foi o BMG, uma empresa do setor de crédito consignado, que na época estampou sua marca em 11 camisas de clubes, incluindo as equipes como São Paulo, Corinthians, Vasco e Cruzeiro. Essa nova onda de patrocínios bancários trouxe um alívio para os clubes brasileiros e possibilitou a continuidade de suas atividades, mesmo diante das adversidades econômicas.

BMG chegou a patrocinar Cruzeiro, Coritiba, Atlético Mineiro, São Paulo e Flamengo

BMG chegou a patrocinar Cruzeiro, Coritiba, Atlético Mineiro, São Paulo e Flamengo

Em um contexto em que empresas privadas demonstravam relutância em investir no futebol devido à instabilidade econômica, um outro banco, desta vez estatal, assumiu a frente e optou pelo investimento: a Caixa Econômica Federal. Esse investimento tornou-se um verdadeiro salva-vidas para muitos clubes, com sua marca sendo estampada em 25 times de todo o país. A presença da Caixa em diversas camisas tornou-se uma poderosa fonte de receita para essas equipes e, ao mesmo tempo, ajudou o banco a fortalecer sua identidade e presença no cenário esportivo nacional. Essa fase da evolução dos patrocínios no futebol brasileiro ilustra como as instituições financeiras perceberam o potencial de marketing que o esporte oferece e como o futebol tornou-se um importante palco para a exposição de suas marcas.

Patrocínio da Caixa nas camisas do Flamengo, Cruzeiro, Atlético Mineiro e muitos outros

Patrocínio da Caixa nas camisas do Flamengo, Cruzeiro, Atlético Mineiro e muitos outros

Problemas de credibilidade na política e no futebol brasileiro

No meio da década, o Brasil enfrentava uma instabilidade política e econômica significativa. O processo de impeachment da presidente Dilma, a derrota acachapante da seleção por 7 a 1 para a Alemanha em casa durante a Copa do Mundo de 2014 e os escândalos envolvendo corrupção na Confederação Brasileira de Futebol (CBF) resultaram em uma séria crise de credibilidade no futebol, afastando os patrocinadores.

Esse declínio ficou evidente nos números das receitas dos clubes na última década. Enquanto em meados de 2010, a publicidade representava a segunda maior fonte de receita dos clubes de futebol, em 2018 passou a ser apenas a quarta maior fonte, ficando atrás até das bilheterias. A perda de confiança dos patrocinadores se mostrou uma consequência direta das incertezas e conturbações vivenciadas no cenário esportivo brasileiro.

Em 2018, no entanto, o número de patrocinadores privados voltou a aumentar, e a credibilidade do futebol brasileiro parecia estar se recuperando. Esse ressurgimento de interesse por parte dos patrocinadores coincidiu com uma decisão do então ministro da economia do governo Bolsonaro, Paulo Guedes, que optou por encerrar todos os contratos de patrocínio que a estatal Caixa Econômica Federal tinha com os clubes. Guedes justificou que havia outras prioridades para investir o dinheiro do que em cultura, o que reforçou a importância dos patrocinadores privados para a sustentabilidade financeira dos clubes de futebol.

Guedes fala em gastar melhor a verba da Caixa, em vez de patrocinar times - Uol

Guedes fala em gastar melhor a verba da Caixa, em vez de patrocinar times – Uol

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A pandemia e o setor de saúde

Mesmo com a pandemia que assolava o mundo, o mercado publicitário do futebol brasileiro manteve-se aquecido. Um exemplo notável desse cenário foi o aumento de 90% nos patrocínios de empresas do setor de saúde na série A entre 2019 e 2020. Em meio à crise sanitária, laboratórios, farmácias e planos de saúde encontraram nesse formato uma oportunidade para popularizar suas marcas e alcançar seu público-alvo, que, por motivos óbvios, passou a estar em casa o tempo todo, sendo constantemente impactado por notícias relacionadas à saúde.

Esse reflexo pode ser claramente observado nos patrocínios de clubes como o Corinthians e o Coritiba. No caso do Corinthians, a Neo Química assumiu a posição de principal patrocinador da camisa e ainda deu seu nome à nova arena do time: a Neo Química Arena. Essa parceria se mostrou uma estratégia bem-sucedida para a empresa, que aproveitou o prestígio e a visibilidade do clube para fortalecer sua marca e alcançar um público amplo, mesmo em meio a um contexto desafiador.

O cenário da pandemia trouxe desafios inéditos para o mercado publicitário do futebol brasileiro, mas também apresentou oportunidades para empresas do setor de saúde se posicionarem de forma relevante no imaginário dos torcedores. Através desses patrocínios, as marcas puderam demonstrar seu comprometimento com a saúde e o bem-estar da população, estabelecendo conexões significativas com os consumidores. A presença cada vez maior dessas empresas nos uniformes dos clubes de futebol reflete o poder da parceria entre esporte e marcas como um meio eficaz de promoção e engajamento com o público-alvo, mesmo em tempos desafiadores como a pandemia.

A nova era dos patrocínios

No final de 2018, o governo de Temer promoveu a legalização dos sites de apostas esportivas no Brasil, abrindo espaço para o crescimento das empresas desse setor. Desde então, essas empresas experimentaram um crescimento significativo, e atualmente, elas se estabeleceram como os principais patrocinadores master dos clubes da primeira divisão do futebol brasileiro.

A evolução dos patrocínios nesse setor reflete a dinâmica do mercado esportivo e o interesse crescente das empresas de apostas em associar suas marcas ao futebol. Essa parceria tem se mostrado benéfica para ambas as partes, uma vez que os clubes recebem investimentos substanciais para fortalecer suas equipes e infraestrutura, enquanto as empresas de apostas aumentam sua visibilidade e acesso ao público apaixonado por futebol.

Conclusão

Ao longo dos anos, a evolução dos patrocínios no futebol brasileiro tem sido um reflexo das transformações econômicas e sociais do país. Desde o período de instabilidade econômica até momentos de crescimento e ascensão de setores específicos, marcas de diversos segmentos têm reconhecido o imenso potencial de visibilidade que o esporte proporciona, investindo consideravelmente para estampar seus logotipos nas camisas dos clubes. Essa parceria estratégica entre marcas e clubes de futebol tornou-se uma força impulsionadora para ambas as partes, fortalecendo a identidade das marcas, promovendo seus produtos e contribuindo para o crescimento da indústria esportiva e de setores diversos no Brasil.

A história dos patrocínios no futebol brasileiro é marcada por momentos cruciais, desde o pioneirismo da Coca-Cola e o Clube dos 13, que abriram novas oportunidades no cenário esportivo após a instabilidade econômica, até as parcerias bem-sucedidas entre empresas do setor eletrônico e clubes vitoriosos, impulsionando a indústria de eletrônicos no país. A chegada dos bancos e, posteriormente, o crescimento dos investimentos do setor de saúde durante a pandemia demonstram a resiliência e a capacidade de adaptação do mercado publicitário diante de desafios inéditos.

A legalização dos sites de apostas esportivas marcou o início de uma nova era nos patrocínios, consolidando essas empresas como principais patrocinadores master dos clubes da primeira divisão do futebol brasileiro. Essa evolução reflete a dinâmica do mercado esportivo e o interesse crescente das empresas em associar suas marcas ao futebol, ao mesmo tempo que os clubes recebem investimentos substanciais para o fortalecimento de suas equipes e infraestrutura. O futebol brasileiro permanece como um poderoso veículo de marketing e promoção, conectando marcas ao seu público-alvo apaixonado pelo esporte, em um cenário que continua a ser moldado pelas transformações econômicas e sociais do país.

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